Porto de Santos 2024: O Retorno, por Samir Keedi
Uma vez mais retornamos ao porto de Santos. Ao longo dos anos temos escrito sobre os seus problemas, e também sobre as previsões, ou desejos para 2024. Em que o porto deve triplicar sua carga operada. Todos conhecem nosso apreço pelo porto de Santos, mas que, também, somos realistas. Não pretendíamos retornar ao assunto tão cedo, mas, diante dos fatos, tornou-se mister. Em 2009 foram traçados planos para o porto movimentar 230 milhões de toneladas de carga em 2024. Apenas relembrando nosso querido Garrincha, esqueceram de combinar com todos – naquele caso com os russos. Não há quem não saiba dos imensos gargalos que lá existem. E quase insolúveis a nosso ver.
Quanto ao porto em si, não vemos problemas de crescimento. Espaço não lhe falta. Áreas para construção de novos terminais sobram. E no momento estão quase prontos mais dois deles, dos maiores do país. E pode-se ir muito além. Pode-se dobrar a quantidade de berços e/ou terminais sem qualquer dificuldade. Quiçá até mais, no caso do uso de dársenas. Em que se constroem mais píeres e menos cais simples. O que se precisa é apenas de investimento. E isso, sabemos, é fácil de obter. A iniciativa privada está ai para isso. O capitalismo existe para viabilizá-la. No caso do Brasil, o problema é o governo não os recursos. Com suas intervenções e regras inadequadas.
Assim, o problema de seu crescimento não é de espaço. É de lógica. A cidade hoje é muito grande para permitir que o porto continue crescendo dessa forma. Já se tornou, a nosso ver, uma opção entre a cidade e o porto. Entre as pessoas e o comércio. E a conjugação dos dois aspectos começa a parecer difícil. Sabemos que o crescimento do porto está sujeito aos acessos, problema grave. Já citamos antes que os acessos atuais não permitem crescimento. Nas atuais condições, sabemos o quanto se leva para ir e voltar ao e do porto. Quanto tempo as pessoas levam para subir e descer para seu lazer. Ou aqueles que trabalham em outras cidades. Ou aqueles de outras cidades que vão para lá. Assim, é o momento de se optar. E entendemos que a opção primária é o ser humano.
E isso é perfeitamente factível num país continental, com tanta costa marítima, Praticamente imbatível. Podendo descentralizar facilmente o crescimento. Dando chance de desenvolvimento a outros estados. Não é produtivo que apenas um porto retenha 25% das operações de comércio exterior do país. E, se nos arraigarmos ao regionalismo, e não quisermos perder carga para outros estados, tudo bem. No próprio estado há espaço suficiente para outros portos. Já apontamos, mais de uma vez, que Peruíbe é a solução do porto de Santos. A questão de acessos é a pior de todas as situações e gargalos. E entendemos como principal problema da expansão do porto. Com a situação de predomínio absoluto do transporte rodoviário interno, a solução é quadruplicar as vias de acesso atuais. Aumentando nesta quantidade as faixas de cada pista existente. Ou construindo novas pistas ou rodovias de acesso. Apenas triplicar manteria no futuro o caos de hoje. E sabemos da quase impossibilidade dessa ocorrência. Tanto pela questão ambiental, séria hoje, quanto pela capacidade de absorção da cidade.
Uma mudança da matriz de transporte ajudaria. Mas quanto da carga atual e futura pode ser transportada por via férrea? A ferrovia poderia passar dos atuais estimados 20% da carga, para 40%. Hoje, 20%, significa quase 20 milhões de toneladas. Teria que avançar para 90 milhões. Será viável para uma ferrovia em direção a Santos? De qualquer modo, mesmo assim, a rodovia continuaria tendo problemas. 80% hoje é cerca de 75 milhões de toneladas. 60% em 2024 será 140 milhões. Assim, salvo melhor juízo, nos parece fora de cogitação conseguir triplicar a carga do porto de Santos impunemente. E nem estamos citando as perimetrais, que mesmo prontas, certamente não darão conta. Também a dragagem do porto, cujos 15/16 metros nunca são atingidos.
Assim, a construção de dois novos terminais, elevando a capacidade de embarque de containers de 3,5 milhões para 6,0 milhões de TEUs (twenty feet or equivalente unit), embora bem-vindos, claro, e sempre, só agravarão os problemas de Santos. Fora outras cargas. O melhor teria sido construir em outros locais. Rezamos sempre para a “Santa Portuária” que estejamos errados. Desta forma, é aguardar para ver no que vai dar este sonho. A menos, é claro, que se queira realmente destruir a qualidade de vida da cidade. Duramente conquistada com o tempo. Claro que com a ajuda do porto, mas, a continuidade do mesmo processo pode ter efeito contrário.
No porto isso funciona como o processo de se alimentar. Quando temos fome, comemos. Conforme vamos comendo, e nos satisfazendo, vai se reduzindo nossa necessidade e capacidade de comer. Mas, muitas vezes nos esquecemos disso, em especial num belo churrasco. Ou numa sensacional feijoada. Resultado é aquela sensação de peso, de mal-estar, que nos obriga a um sal de fruta ou algo equivalente. Ou seja, para tudo há um limite. Neste caso do porto de Santos, especialmente o espaço e o meio ambiente. E, porque não citar, o próprio investimento para todas as necessidades, não apenas de construção de terminais portuários, armazéns, pátios, etc. O custo de construção de estradas e ferrovias não é baixo nessas necessidades. Em especial neste país, que todos sabemos, pessoas e corporações não funcionam como deveriam, como nossos representantes. Mas apenas como deles próprios.
Artigo divulgado na revista Sem Fronteiras, de novembro de 2012