Maldição do Protecionismo, por Samir Keedi
E lá vamos nós de novo! Sempre querendo fazer tudo errado. Estamos ávidos por saber quando aterrissaremos no planeta Terra. E sermos mais normais. Uma vez mais, ao invés da melhoria da nossa competitividade, estamos adotando o protecionismo contra a competitividade estrangeira. Vamos matar a vaca para eliminarmos o carrapato. Solução digna do grande acampamento tupiniquim.
Enquanto as coisas vão bem, com superávits enormes na balança comercial, a vida continua e ninguém se importa. Quando as coisas começam a complicar um pouquinho, o que faz parte das regras do jogo, já queremos usar o remédio errado contra as nossas doenças. Como dizia um quase filósofo amigo “tudo está bem, enquanto está bem”.
Durante muitos anos nossa balança comercial tem sido superavitária. Aliás, uma situação normal para nós, com exceção do famigerado período entre 1995 e 2000. Em que políticas erradas do governo nos levaram a déficits consideráveis. Embora trágicos, pois muito grandes, e que causaram bom estrago, eram pontos fora da curva. Não condizente com nossa história de superávits quase permanentes.
Durante alguns anos tivemos superávit na balança comercial automotiva com o México. De alguns anos para cá, invertemos o fluxo e passamos a ter déficits. Embora grandes, não afetam a nossa balança comercial. Que se mantém superavitária, com muita folga. Déficits pontuais com alguns países são normais. O que importa é a situação geral, e esta tem sido favorável a nós. Em 2011, por exemplo, o superávit foi de astronômicos 30 bilhões. Considerando exportação de 256 e importação de 226 bilhões, realmente é grande demais em nossa opinião.
Mas, esquecendo-nos de regras triviais, já forçamos o México a rever o Acordo automotivo, ACE 55 (Acordo de Complementação Econômica 55), imprimindo a ele um teto no déficit brasileiro. Por enquanto (sic) por três anos. E, vencida esta etapa, em que a limitação já está em vigor, o novo alvo são os vinhos importados. Que causam estragos à nossa indústria vinícola. E não devemos nos esquecer do brutal aumento do IPI sobre os carros importados. E, o novo alvo são bens de capital, apenas alguns, que poderão ter licença não-automática. Como já sabemos e podemos esperar, estes “alguns” podem ser apenas a porta de entrada. E La nave va.
Se todos resolverem fazer a mesma coisa, quem perderá? Claro caro leitor, a resposta já está na ponta da sua língua. O Brasil, pela situação retro descrita. Portanto, não nos parece uma forma inteligente de favorecer o país e os setores envolvidos nesta reserva de mercado.
Já conhecemos de sobejo o que isso significa. E, como costumamos citar aos nossos alunos, a indústria automobilística, com a sua produção de carroças, e a informática, são excelentes, e bota excelentes nisso, exemplos de uma política nociva de proteção à indústria nacional no passado. Os consumidores brasileiros pagavam fortunas por mercadorias de péssima qualidade. E desconectadas com o mercado internacional e o que se fazia no mundo.
Na abertura econômica implementada no início dos anos 1990 todos perceberam isso. Mas, parece que muita gente está com saudades daqueles péssimos tempos de economia fechada. Se não pode fechar, parta-se ao protecionismo. Pobres mentes obsoletas. Sempre olhando pelos retrovisores, não pelo parabrisa.
O que o país precisa não é deste protecionismo maléfico. Que pode receber respostas externas, o que seria ruim apenas para nós. O país precisa de outro tipo de protecionismo. Que é um antídoto contra as péssimas políticas econômicas do país. E não só a indústria, como toda a economia brasileira, assim como os consumidores.
O que se precisa é de taxas de juros mais baixas e condizentes com a economia mundial. Carga tributária decente, que se coadune com o nível da nossa economia. E, por que não, também seguindo os demais países cujo desenvolvimento esteja mais pari-passu com o nosso. E mesmo países de alto desenvolvimento como os EUA e Japão, cuja carga tributária é de cerca de 70% da nossa.
Precisamos de uma redução drástica do custo da mão-de-obra, que é demasiada pesada. E muitas outras políticas mais adequadas. Resumindo, precisamos de um choque de competitividade, que nos coloque em condições de disputar mercados com todos os demais países, e não mero protecionismo significando tolhimento da liberdade econômica.
Precisamos entender que nossos problemas são internos e não externos. Se temos déficit na indústria automobilística, a culpa é nossa por continuarmos a produzir carroças. Só que agora um pouco melhores, com direção hidráulica e ar-condicionado.
Artigo divulgado na Revista Sem Fronteiras, em maio de 2012.
Samir Keedi é economista, especialista em transportes internacionais, professor e autor de vários livros sobre Comércio Exterior, Transporte e Logística.